22 Set 2021
7 min
Guardar energia para quando é necessária não é um conceito novo, mas torna-se ainda mais crítico num mundo cada vez mais eletrificado. Reforçar o armazenamento energético é garantir a flexibilidade de uma rede elétrica focada nas renováveis.

É algo que todos os seres vivos fazem desde sempre: guardar energia. O que comemos, converte -se em energia física e mental acumulada para o nosso corpo fazer as tarefas do dia-a-dia. É desta forma que André Botelho, Head of Energy Storage & Flexibility da EDP Inovação, explica o conceito básico de armazenamento de energia. Aplicado ao sector elétrico e energético, o armazenamento ganha maior relevância, numa altura em que a geração vem, cada vez mais, de fontes renováveis intermitentes, como o sol ou o vento, o que traz dificuldades à gestão das redes de distribuição.

André Botelho
close

“O consumo ainda não controlo, a geração cada vez menos, vou precisar de uma peça do puzzle que faça o que o nosso corpo faz, que guarde a energia.“ André Botelho, EDP Inovação

Tanto se pode armazenar energia para utilização instantânea, nas baterias por exemplo, que estão sempre prontas a libertar corrente elétrica e podem ser recarregadas; como na forma de potencial de produção, no caso da água guardada das barragens. O hidrogénio e a energia térmica - que podem ser conseguidos através da utilização de eletricidade renovável excedentária, para posterior utilização direta ou novamente para geração elétrica - também são formas de armazenamento. É possível aplicar as várias soluções existentes à escala da rede (grid scale), em grande formato, ou ‘atrás do contador’ (behind the meter), para um consumo particular que inclui ou não entrega de energia à rede de distribuição.

Para Pablo Berruecos, responsável pela nova unidade de negócio da EDP Renováveis na América do Norte, dedicada ao armazenamento de energia, esta é uma área que interessa desenvolver agora. Não só “adia a necessidade de produção energética”, como ajuda a “encontrar melhores momentos para enviar a energia de volta à rede”. É um processo complexo, com muitas variáveis, mas que permite “equilibrar a produção e a disponibilização de energia elétrica, ao combinar não apenas fontes de energia que estão sujeitas a condições climatéricas, mas também unidades de armazenamento dessa mesma energia, numa rede que, por sua vez, está sujeita às flutuações de procura”.

O armazenamento permite “encontrar melhores momentos para enviar a energia de volta à rede”, explica Pablo Berruecos, da EDP Renováveis América do Norte

O armazenamento de energia é também crítico para a descarbonização, dado que não só pode garantir a gestão eficiente das redes de distribuição de eletricidade - vinda de várias áreas de produção -, como também ajuda a reconverter instalações baseadas em combustíveis fósseis, como as centrais térmicas. Para André Botelho, a neutralidade carbónica não pode ser atingida “se nós não tivermos estas ferramentas que nos tragam flexibilidade”. É essa a palavra-chave, flexibilidade, é isso que permite gerir, a todo o momento, diferentes tipos de geração e de consumo.

Nem só de barragens e baterias vive o armazenamento
Atualmente, cerca de 95% do armazenamento de energia para conversão em eletricidade é assegurado pelas centrais hídricas. Mas, tanto as novas necessidades da sociedade - que está a ficar cada vez mais eletrificada, desde as casas aos veículos - como a intermitência das renováveis, obrigam a apostar em novas soluções e tecnologias. Segundo André Botelho, há muitas respostas possíveis, quer em utilização, quer em estudo: “Existem muitos tipos de necessidades e muitas tecnologias, e isto vai fazendo uma matriz. É um espaço que está em ebulição”. Todas estas formas de armazenar energia “dão para alguma coisa”, continua, pelo que “encaixar isto tudo onde vai fazer sentido é um desafio muito interessante de olhar”. O armazenamento pode ser mecânico, eletroquímico, térmico ou químico, com várias soluções a saírem de cada um destes ramos.

Hídrico. As barragens, em que um reservatório acumula água que, na altura de produção de energia elétrica, é descarregada e passa por turbinas de geração.
Hídrico com bombagem. Nos períodos de menor consumo, recorre-se a bombas para trazer água de volta ao reservatório, ou transportá-la para um outro mais acima, ficando pronta a voltar a passar nas turbinas quando a procura aumenta.
Ar comprimido. Seguindo o mesmo princípio do aproveitamento de energia, o excedente de produção é usado para comprimir ar num reservatório ou poço. Quando é necessário gerar eletricidade, o ar libertado põe um gerador de eletricidade em funcionamento.
Flywheel. Energia cinética que é conseguida através de um rotor que se mantém a girar num compartimento estanque. Acumula energia a acelerar, desacelera quando é libertada.
Energia gravítica. ‘Simula’ a produção hídrica através de pesos, que tanto podem ser subidos numa encosta, num túnel inclinado ou numa torre. A descida do peso aciona a produção de eletricidade.

Baterias recarregáveis. As mais usadas neste momento são as de iões de lítio, tanto em pequenos telemóveis como em transportes ou edifícios. Mas antes destas já existiam as baterias de ácido - que continuam presentes nos veículos a combustão. As baterias de níquel-zinco - que a EDP NEW está a testar no projeto LOLABAT (link para texto baterias) -, também são uma opção.
Baterias de fluxo. Semelhantes às células de combustível utilizadas em veículos a hidrogénio, as baterias de fluxo produzem energia pela passagem de iões em líquido, através de uma membrana entre dois tanques.
Super condensador. Um tipo de bateria que dura muito menos tempo do que as de iões de lítio, mas também se carrega bastante mais rapidamente e suporta mais cargas e descargas. Usado em aparelhos eletrónicos como berbequins ou flashes de máquinas fotográficas.

Power to gas. A transformação de eletricidade excedentária num gás, hidrogénio ou metano, através da eletrólise de água. O hidrogénio verde é, atualmente, um dos maiores impulsionadores deste método, e pode ser usado depois para combinar com gás natural, para utilização industrial, ou para reconverter em energia elétrica para transportes.
Power to liquid. Transformação de eletricidade em hidrogénio líquido, metanol ou amoníaco, que podem depois ser usados em combustíveis sintéticos, na indústria ou na geração elétrica também.

Calor sensível. Um sólido ou líquido, como certos tipos de sais, pode guardar energia quando é aquecido. Ao ser libertado, o calor pode ser usado para produzir energia.
Calor latente. O mesmo método, mas que implica a mudança de estado de sólido para líquido ou gasoso ao acumular a energia térmica.
Criogénico. O excedente de eletricidade é usado para liquefazer oxigénio a temperaturas muito baixas. Ao voltar ao seu estado normal expande e movimenta uma turbina de produção.
Bateria Carnot. Uma hipótese para reformular centrais térmicas. Em vez de aquecer carvão ou gás para produzir energia, armazena-se eletricidade excedentária na forma de calor, para converter novamente em eletricidade na central.

armazenamento de energia

Armazenar energia para um futuro melhor

Se a energia renovável é um dos caminhos para atingir a neutralidade carbónica, o armazenamento de energia assegura a sua eficácia. Tudo para que a energia solar e eólica possa continuar a crescer e para que a necessidade de combustíveis fósseis seja cada vez menor.